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Original do decreto revela motivos da intervenção federal em Araras em 1970

"O município de Araras está completamente acéfalo em virtude de ter sido decretado o afastamento do seu prefeito, Senhor Milton Severino, e o seu substituto legal, o vice-prefeito Acesio Devite, não reunir condições morais para assumir o cargo", foi o que escreveu o então ministro da Justiça da ditadura civil-militar, Alfred Buzaid, no dia 23 de abril de 1970. O documento foi obtido pelo presidente da Câmara, vereador Breno Cortella em sua viagem à Brasília na semana passada, que incluiu encontro com o Ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo e visita ao Arquivo Nacional.

As imagens obtidas são dos documentos originais do decreto federal nº 66.537 de 6 de maio de 1970, que decretou a intervenção federal em Araras e nomeou o coronel Theodoro de Almeida Pupo para governar a cidade. São documentos datilografados à máquina, com marcações de datas, numeração à mão e com as assinaturas do ministro da Justiça e do então presidente da República, Emílio Garrastazu Médici, General do Exército que governou o Brasil durante a ditadura de 1969 a 1974. Além de carimbos e referências também é possível verificar a marca d'água com o Brasão da República e a inscrição "Estados Unidos do Brasil".

O conteúdo inédito e até então desconhecido é a chamada "exposição de motivos" do decreto federal. Trata-se de manifestação do ministro da Justiça dirigida ao presidente da República quando encaminha para análise da presidência o "projeto de decreto de intervenção federal no município de Araras". 

A pesquisa desse período da história do município vem sendo realizada pela Comissão da Verdade da Câmara. Antes a versão conhecida do decreto era somente aquela disponibilizada pelo Senado Federal em sua página na internet. A partir das informações desse documento digital foi solicitada a busca pelos originais.

"Não há qualquer dificuldade legal para solucionar, a questão, porque o disposto no artigo 7º do Ato Institucional nº 07, de 1969, determina essa providência", afirmava o então ministro Buzaid. O documento segue também com diversas citações de documentos de órgão militares, da Chefia de Gabinete do Ministério do Exército, do Chefe do Estado Maior do Exército e do Comandante do II Exército, estes dois últimos identificados como de caráter "reservado". Há também uma folha com anotações da Diretoria de Expediente com a "Rotina de Preparo" do decreto federal.

O presidente da Câmara, vereador Breno Cortella, considera esse um documento essencial sobre a intervenção federal em Araras. "Conhecendo o funcionamento da burocracia administrativa sempre suspeitei que houvesse um processo e manifestações que antecedessem o ato da intervenção, o que pudemos confirmar agora com o apoio do ministro da Justiça", disse. Breno também apontou que o processo administrativo na íntegra não foi localizado, mas que a Comissão da Verdade ainda fará esforços para isso. "Gostaríamos de obter a íntegra de tudo isso, inclusive dessas manifestações militares, mas isso será uma busca mais detalhada e com chance de terem sido perdidos ou destruídos", aponta.

O presidente acredita que esse capítulo da história da cidade pode ser reconstruído agora com mais detalhes. "A intervenção federal foi formalmente justificada como se o prefeito Milton Severino já estivesse fora do cargo, e ainda tiveram que desqualificar moralmente o vice-prefeito. É uma sucessão de ofensas aos direitos políticos de dois mandatários da cidade e uma ofensa ao direito do povo ararense em ser governado por quem tinha sido escolhido em eleição. Sem falar na ofensa pessoal que a ditadura fez ao então vice-prefeito, apenas para que ele não fosse empossado como sucessor natural do prefeito", afirma Breno.   

Uma linha específica de pesquisa pela Comissão da Verdade deverá ser desenvolvida com base nesse documento. "O prefeito Milton Severino é tratado como se não estivesse no cargo e a cidade estivesse sem o prefeito, o que aparentemente não era o caso, pois isso só teria ocorrido com aquela intervenção e não o contrário. Teremos que realizar uma análise aprofundada da cronologia dos fatos para entender esse jogo de atos e informações que foram lançadas para tentar justificar uma intervenção que foi autoritária, uma das marcas conhecidas daquele regime”, explica Breno.

Foi entregue ao presidente Breno Cortella um conjunto de imagens digitalizadas que estão sendo analisadas pela Comissão da Verdade da Câmara. A pesquisa e a entrega desses documentos foram realizadas pela regional de Brasília do Arquivo Nacional, órgão vinculado ao Ministério da Justiça e contou com o apoio da Secretaria de Assuntos Legislativos do mesmo Ministério. 

 

Comissão

 

A Comissão da Verdade da Câmara Municipal foi instituída pela resolução nº 05/2013, de autoria do vereador Breno Cortella. É composta pelos vereadores, Breno Cortella, Eduardo Elias Dias – Du Segurança (PHS), Francisco Nucci Neto (PMDB), Valdevir Carlos Anadão – Profº Dê (PT) e pelo historiador Fabio Eduardo Cressoni.

 O trabalho da Comissão é norteado pela promoção de esclarecimentos em relação a violações de direitos humanos e ofensas à democracia ocorridas em Araras, contra suas instituições ou contra pessoas com vínculo com o município durante o período fixado entre os anos de 1964 e 1985, período da Ditadura Militar no Brasil.

O objetivo da Comissão é integrar, complementar e colaborar com a Comissão Nacional da Verdade prevista na Lei Federal nº 12.528/2011, com a Comissão da Verdade do Estado de São Paulo e outras Comissões da Verdade instituídas.

Neste mês a Câmara aprovou a prorrogação do prazo de funcionamento da Comissão Municipal que terá até o dia 1º de abril de 2015 para seu funcionamento, emissão de relatórios e conclusão dos trabalhos.

 

 

 

ANEXO 1: Arquivo obtido pelo presidente da Câmara, vereador Breno Cortella, no Ministério da Justiça, fornecido pelo Arquivo Nacional em Brasília.

ANEXO 2: Decreto de Intervenção compilado disponível na página do Senado Federal (www.senado.leg.br). 

 

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Publicado em: 14/04/2014 17:36:00

Publicado por: Imprensa